Deficiência mental e exercício

Por Elke Oliveira

27 de abril de 2004

A falta de incentivo à prática de atividades físicas por parte da família, escola e sociedade, faz com que os portadores de deficiência mental sejam cada vez mais sedentários. O que torna difícil prover-los de autonomia e melhores condições sobrevivência. Estudos apontam que a prevalência de obesidade é maior, e a força muscular é expressivamente menor, em indivíduos com deficiência mental, comparados à população em geral (BEANGE; MCELDUFF e BAKER, 1995).
Diversas pesquisas têm demonstrado que deficientes mentais podem obter os mesmos benefícios com a atividade física que pessoas sem deficiência, como: aumentos de força e melhoras na performance das atividades diárias, além de aprimorar as funções metabólicas (STOPKA et Al., 1994).
O treinamento de força pode ser um ótimo coadjuvante para a melhora geral do cotidiano dos portadores de deficiência mental, inclusive, diminuindo os riscos de acidentes e quedas (DEWITT & ROBERTS, 1991). Porém, não se tem pesquisado a fundo esse tema. A maioria dos estudos enfoca o treinamento aeróbio e pouco se tem publicado sobre a força muscular e hipertrofia.

Obesidade

Inicialmente existia uma tendência em afirmar que a prevalência de obesidade era inversamente proporcional ao nível de inteligência. De modo que, quanto menor o QI, maior a obesidade (KREZE et al., 1974). Entretanto, FOX & ROTATORI (1983) revelaram dados opostos. Em uma pesquisa utilizando a relação peso/altura com 1152 deficientes mentais adultos, a prevalência de obesidade foi maior no grupo com deficiência leve a moderada (grupo 1) quando comparada com deficiência severa/profunda (grupo 2). No grupo 1, 38% das mulheres e 28% dos homens foram classificados obesos, contra 14% e 7% respectivamente dos indivíduos do grupo 2. Um estudo de KELLY et al. (1986) chegou a uma conclusão similar ao avaliar 553 indivíduos adultos por meio de um protocolo com 3 medidas de dobras cutâneas. Neste estudo o grupo de deficiência mental severa / profunda demonstrou a menor média de % de gordura. É provável que o sedentarismo e os hábitos alimentares sejam a maior causa de obesidade em indivíduos com deficiência mental, e a menor obesidade demonstrada nos indivíduos com deficiência grave ou profunda, pode ser explicada pela total dependência de supervisão impedindo um maior consumo calórico.
Crianças portadoras de deficiência mental não apresentam o mesmo índice de obesidade que os adultos, demonstrando que a obesidade nessa população aumenta com a mudança do estilo de vida em decorrência da idade. Porém, indivíduos adultos que participam de atividade físicas tem níveis normais de gordura corporal (PITETTI et al., 1989), embora com maior média quando comparados a indivíduos normais.

Treinamento de força
STOPKA et al. em 1994 realizaram um estudo no qual 11 jovens com deficiência mental de leve a severa executaram um treinamento de força com 1 série de 10 a 15 repetições em 8 exercícios (envolvendo os principais grupamentos musculares). Para avaliar o ganho de força foram realizados testes de 3 RM (repetições máximas) em 3 dos 8 exercícios. Após 23 semanas os resultados no pós-teste revelaram ganhos significativos força em todos os exercícios testados, tanto de forma absoluta quanto relativa. O interessante é que a gravidade da deficiência mental não influenciou nos resultados. Em outro estudo, RIMMER e KELLY (1991) revelam que o treinamento resistido de alta intensidade pode induzir drásticos aumentos de força em apenas 9 semanas. Além disso, ao final do experimento, os deficientes mentais conseguiam utilizar os equipamentos com o mínimo de ajuda e, o mais emocionante, todos demonstraram desapontamento e tristeza quando souberam que a pesquisa tinha acabado. Esses e outros estudos (SUOMI, 1998) apóiam a idéia que portadores de deficiência podem participar de treinamentos similares à população em geral e que, além de melhoras fisiológicas, também há benefícios psicológicos como: melhora na auto-estima e bem estar.

Capacidade Cardiorespiratória
Indivíduos com deficiência mental possuem capacidade cardiovascular 25 a 35% inferior à média da população, além de valores de freqüência cardíaca máxima 8 a 30% menores. Isso pode ser explicado pelo sedentarismo e elevado grau de obesidade que acompanham esses indivíduos (FERNHALL, 1993).
O treinamento cardiovascular em indivíduos deficientes mentais tem se mostrado eficiente. Pois, os resultados influenciam positivamente o lazer e a execução das atividades diárias. A simples participação em programas de caminhadas pode melhorar o equilíbrio, a capacidade cardiorespiratória e a resistência nos músculos dos membros inferiores (FERNHALL, 1993).
Um fator interessante é que poucos estudos demonstraram melhoras no VO2max após o treinamento, enquanto outros achados não demonstram qualquer alteração. Não se sabe ao certo se isso é conseqüência da própria deficiência (que limitaria o débito cardíaco por redução das respostas simpáticas ao exercício), de erros no monitoramento das intensidades e/ou da falta de motivação para prática de exercícios intensos (FERNHALL, 1993).

Conclusões

– A prevalência da obesidade é maior em indivíduos com deficiência mental quando comparados à população em geral. O estilo de vida sedentarismo e maus hábitos alimentares são em grande parte os responsáveis por esses dados.
– Os níveis de força nas pessoas com deficiência mental são extremamente baixos. Porém, foi verificado que o treinamento resistido pode trazer respostas positivas.
– Os baixos níveis de VO2máx tem dificultado as atividades diárias.
– Segundo a OMS, no Brasil 10% da população tem algum tipo de deficiência (14,6 milhões de pessoas), sendo que 5,8 milhões são deficientes mentais. Esses números são suficientemente grandes para alertar a comunidade científica, no tocante ao incentivo às pesquisas que enfatizem a elaboração de treinamentos realmente eficientes que melhorem as qualidades físicas necessárias para tornar menos sacrificante a vida dessas pessoas e seus familiares.

Referência Bibliográficas
BEANGE H, MCELDUFF A, & BAKER W. Medical disorders of adults with mental retardation: A population study. American Journal on Mental Retardation, 99, 595-604. 1995.
DEWITT J, & ROBERTS T. Pumping up an adult fitness program. JOPERD. 67-71. 1991.
ERNHALL B. Phisical fitness and exercise training of individual with mental retardation. Medicine sciece sports exercise. 25(4): 442-450. 1993.
FOX R & ROTATORI AF. Appropiate classification of obesity of mentally retarded adults. Am. J. Ment. Defic. 88:112-114. 1983.
KELLY LE, RIMMER HJ, & NESS RA. (1986). Obesity levels in institucionalized mentally retarded adults. Adapt. Phys. Activity Q. 3:167-176. 1986.
KREZE A, ZENILDA M, JUHAS J, & GARBARA M. Relationship between intelligence and relative prevalence of obesity. Human. Biol. 46: 109-113. 1974.
PITETTI KH, JACKSON JA, STUBBS NB, CAMPBELL KD & BATTAR SS. Fitnes levels of adult special olympics participants. Adapt. Phys. Activity Q. 6:354-370.1989.
RIMMER JH & KELLY LE. Effects of resistence training program on adults with mental retardation. Adapt. Phys. Activity Q. 8:146-153. 1991.
STOPKA CL, LIMPER L, SIDERS R, GRAVES J, GOODMAN BA & SILVERSTONE E. Effects of a supervised resistence training program on adolescentes and young adults with mental retardation. J. Strength and Cond Res. Vol.8 n°3 pp:184-187.1994.
SUOMI R. Self-directed strength training: its effect on leg strength in men with mental retardation. Arch Phys Med Rehabil. Vol.79 n°3 pp:323-8. 1998.

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