Educação física escolar: novas perspectivas em saúde pública

Por Vandeir Gonçalves

2 de agosto de 2004


O sedentarismo é visto atualmente como um problema mundial de saúde (1).

Entre as razões que levam à inatividade, um dos possíveis fatores é o desconhecimento sobre como se exercitar, as finalidades de cada exercício, limitações de alguns grupos populacionais e percepções distorcidas em relação aos benefícios do movimento. (1)

Os motivos que levam ao desconhecimento vão da falta de vontade própria em buscar informação até a inexistência de programas governamentais de esclarecimento, passando pelos profissionais de saúde que, muitas vezes, ignoram o valor do exercício físico e/ou não são efetivos no incentivo à prática regular de exercícios físicos (1).

Dentro deste cenário, fica clara a necessidade em se levar à população, maiores e melhores informações a respeito de saúde e atividade física. Neste ponto, a escola se torna um espaço vital para a disseminação de informações e atos práticos a este respeito, aumentando os níveis de conhecimento sobre exercícios físicos podendo fazer com que os níveis de sedentarismo não aumentem, e fornecendo a população verdadeiros serviços em saúde pública.

Inatividade e saúde

Sabe-se hoje que o exercício físico pode ser um fator protetor para uma série de males, entre os quais destacam-se: obesidade, doenças cardiovasculares, diabetes, osteoporose, depressão e maior mortalidade por causas gerais (1). Ainda assim, o número de praticantes freqüentes de atividades físicas é baixo. Na Austrália e nos EUA, a prevalência de praticantes freqüentes de atividades físicas é estimada em 10% da população adulta(2). Dados nacionais provavelmente se encontram em um número muito inferior a este.

A falta de tempo é o motivo mais freqüentemente citado para não se exercitar, o que também pode ser a resposta mais socialmente aceita, demonstrando uma falta de motivação para o exercício (2), e de desconhecimento sobre a quantidade de possibilidades disponíveis e de quanto tempo se gastaria semanalmente na realização de atividades físicas.

A desinformação é tamanha que o exercício é considerado desnecessário, apoiado na crença que as pessoas devem ser saudáveis o suficiente e pensarem que suas rotinas atuais irão mantê-las saudáveis, além de ser visto como algo arriscado, criando a idéia de que o exercício é inapropriado para populações especiais.

Coincidentemente ou não, quanto mais sedentário, e desinformado, mais desnecessário o indivíduo considera a prática de atividades físicas. A indiferença com que se vê a atividade física é uma grande barreira (2), dificultando sua efetivação.

Informação e desinformação

Em uma amostra de 3182 pessoas, os meios de comunicação foram a fonte de informação mais freqüente sobre os benefícios do exercício físico, seguida pelo médico e por parentes ou amigos. Cabe salientar que mais de um quinto da amostra refere que nunca recebeu este tipo de informação (1).

Profissionais da saúde em geral podem também ter dificuldades em transmitir conhecimento à população sobre os benefícios do exercício físico, não sendo este benefício amplamente entendido e aceito por ambos (2).

Onde fica então o papel da escola em fornecer informações para os futuros adultos que lhe caem às mãos sobre saúde e atividades físicas? Sendo o professor de educação física conhecedor dos benefícios que a vida ativa pode trazer as pessoas, não seria este responsável pela distribuição deste conhecimento?

Entretanto o aconselhamento sobre as vantagens de uma vida ativa não é uma prática comum entre professores (1).

Na verdade, as práticas atuais de atividades físicas, podem colaborar para afastar os futuros adultos de uma vida ativa. O exercício por vezes é associado com sentimentos negativos como vergonha e sensação de ridículo, advindos provavelmente de uma história negativa pregressa. Qualquer política de promoção da saúde interessada em educar e motivar adultos a mudarem seu comportamento e ajustarem suas prioridades deve levar em conta suas crenças, atitudes e interesses como co-determinandes de seu comportamento atual (2).

A criação de locais públicos destinados ao exercício físico, juntamente com programas locais de divulgação sobre atividade física, pode ser uma ferramenta efetiva no combate ao sedentarismo, principalmente se focalizar esforços nestes dois campos: aconselhamento médico a toda a população e ações no âmbito escolar para o incentivo e esclarecimento sobre este tema mais precocemente (1).

Avaliando a saúde na escola

A academia americana de pediatria tem apoiado à importância de amplas e periódicas avaliações de saúde; sempre que possível estas avaliações devem contar com a supervisão de orientadores físicos (3).

Esta avaliação deve incluir uma revisão do histórico médico com atenção para aspectos físicos, emocionais e problemas familiares que possam influenciar o desenvolvimento escolar, acompanhamento do desenvolvimento motor, onde educadores físicos e profissionais de saúde possam colaborar e servir para prover informações ao sistema educacional a respeito do histórico médico, exames físicos e desenvolvimento. Deve incluir, mas não se limitar a peso, altura, maturação física e sexual, e pressão sanguínea, podendo incluir também avaliação muscular e de resistência (3). Qualquer achado anormal deve ser monitorado pelo educador físico (3).

A comunicação direta entre educadores físicos, escola e pais deve ocorrer para determinar as necessidades de crianças que necessitem de cuidados especiais de saúde, podendo ser criado juntamente à escola um organizado sistema que armazene amplas informações de saúde para cada estudante (3).

Saúde pública

Perguntados sobre quem seria o responsável pela prevenção de doenças, 57% dos entrevistados indicaram o governo como o principal responsável por este serviço, enquanto 40% responderam que “qualquer um” é responsável (4). Na verdade todas as pessoas podem ser classificadas como agentes de saúde ativos e passivos enquanto usuários de um meio comum e participantes de uma coletividade.

Vejamos então um exemplo: em uma comunidade com noventa mil habitantes e apenas um hospital, apoiado um posto de saúde, temos cerca de mil e duzentos estudantes em um dos colégios de ensino fundamental.

Poderíamos então ter mil e duzentos novos agentes de saúde ativos na divulgação de atividades físicas e bons hábitos de vida influenciando em um contexto comunitário, reforçando o aprendizado como uma prioridade na vida de nossos estudantes.

Prover à comunidade educação e aconselhamento sobre serviços que possam melhorar a saúde tais como: programas de educação nutricional, programas sobre álcool e abuso de drogas e programas de prevenção ao uso de tabaco, foi considerado nos EUA em 1996 como uma das principais prioridades em se tratando de serviços de saúde pública. Aumentar a qualidade da educação, e encorajar pessoas a terem um estilo de vida mais saudável, através de bons hábitos alimentares, prática de atividades físicas e não uso de tabaco, também foi destacado como muito importante (3,4).

Considerações finais

A OMS define qualidade de vida como a percepção que os indivíduos têm de sua posição na vida no contexto de cultura e sistema de valor no qual vivem e se relacionam com suas metas, expectativas, padrões e interesses. Talvez seja intuitivamente óbvio que saúde e vida são inseparáveis e, sendo assim, que o significado de saúde deve estar em qualquer conceitualização de qualidade de vida (5).

Mudanças no conteúdo programático da educação física inserida no âmbito escolar podem resultar em melhoras qualitativa e quantitativa no conhecimento das pessoas a respeito de saúde, atividade física, e dos efeitos e influências que um pode ter sobre o outro. De posse deste importante conhecimento, podemos vislumbrar uma melhora geral na qualidade de vida e na saúde das pessoas, reduzindo possivelmente os gastos com saúde pública. Um mundo onde saúde e qualidade de vida fossem mais facilmente compreendidos e divulgados poderia ser o mesmo mundo onde os seres humanos teriam uma longevidade maior e mais feliz.

Referências bibliográficas

1)Domingues, Marlos Rodrigues; Araújo, Cora Luiza Pavin; Gigante, Denise Petrucci. Conhecimento e percepção sobre exercício físico em uma população adulta urbana do sul do Brasil. Cad. Saúde pública, vol 20 nº 1 pp. 204-215, 2004.
2)Vanden Auweele Y. Rzewnicki R, van Mele V. Reasons for not exercising and exercise intentions: a study of midle-aged sedentary adults. J. Sports Sci. Vol. 15 nº2 pp: 151-65, 1997.
3)American academy of pediatrics. Scholl health assessments. Pediatrics vol. 105 nº 4, pp: 875-877, 2000.
4)Leads from the morbidity and mortality weekly report. Public opinion about public health- California and the United States, 1996. JAMA, vol. 279 nº 11, pp: 819-821, 1998.
5)Alleyne, George A. O. health and the quality of life. Rev. Panam publica/pan am j public health vol. 9, nº 1, pp: 1-6, 2001.

Artigos Relacionados

EPOC