Em memória de Luiz Henrique Augusto Fonseca, Luiz Casca

Por Paulo Gentil

27 de fevereiro de 2003

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Em 1995 pisei pela primeira vez em uma academia de musculação, até então a imagem que tinha de tais lugares era de um bando de “morambeiros” malhando sob a orientação do “marombeiro chefe”, normalmente um indivíduo prepotente e nada inteligente, o chamado “instrutor”. Logo no primeiro dia de academia tive um choque, o “instrutor” pediu educadamente que eu voltasse para casa, pois eu inocentemente havia ido de chinelo para a musculação. Obviamente fiquei muito chateado no dia e até criei uma má impressão do “instrutor”.

Nesta época, eu estava finalizando o segundo grau e ainda tinha muitas dúvidas acerca do curso a escolher no vestibular, por ser um bom aluno todos apontavam para cursos como Odontologia e Medicina, porém eu sabia que não era isso que eu queria. E, ao observar o trabalho deste professor, a seriedade com a qual ele o conduzia, o respeito com que era visto e, principalmente, sua paixão pela profissão, comecei a acreditar em uma antiga vontade que estava adormecida devido a preconceitos socioculturais: cursar Educação Física. E assim foi. Em 1996 me tornei aluno do curso de Educação Física da Universidade de Brasília para o espanto e desespero de muitas pessoas.

Meu professor (um profissional como ele não “instrui” e sim “ensina”, portanto o termo instrutor mostrou-se totalmente inadequado) se ofereceu prontamente para me ajudar e assim o fez. Ainda lembro de meu primeiro emprego, eu ainda cursava o segundo semestre de Educação Física e a academia onde “malhava” precisava de estagiário (na época não havia restrições legais quanto a isso) e meu professor me indicou para o cargo. No dia da entrevista, o professor foi comigo e falou ao dono da academia que eu seria o novo estagiário. O dono ao me ver (eu era um notório bagunceiro da academia, a única pessoa a qual eu respeitava era meu professor) tentou se opor, mas o professor disse “eu o estou indicando porque confio nele e estou garantindo sua capacidade”, o dono da academia nada fez senão aceitar. Isto foi um marco em minha vida pessoal e profissional, uma pessoa que mal me conhecia, me deu um emprego e ainda colocou o seu como garantia! Sinceramente eu espero que nunca desponte meu professor, Luiz Casca, a quem sou eternamente grato por ter me inspirado e me encaminhado na profissão que tanto amo. Durante um bom tempo eu fui orgulhosamente estagiário do professor Luiz Henrique, com quem aprendi muito sobre como ser um profissional e uma pessoa melhor.

Nesse tempo, me empenhei tanto que em poucos anos já estava sendo reconhecido, muitos me viam como um excelente profissional… até que um dia meu professor falou: “Paulinho, você está indo muito bem, mas ainda tem que aprender muita coisa” e acrescentou “tecnicamente eu não tenho nada para lhe ensinar, mas tem muita coisa que você tem que aprender”. Na hora aquilo pareceu absurdo, eu achava meus conhecimentos em fisiologia, cinesiologia e outros campos acima da média, tinha domínio de sala, respeito e confiança dos alunos… se aquilo viesse de qualquer outra pessoa mereceria uma resposta imediata, porém foi dito pelo Luiz Casca, e me fez pensar durante dias, semanas, meses, anos… me obrigando a amadurecer e evoluir, Luiz não estava falando somente da profissão, estava falando da vida. E só há pouco tempo percebi isso. Dentre as milhares de perguntas que eu gostaria de fazer ao meu professor uma delas é: “e agora, o que você acha de mim?”.

Luiz tinha a capacidade de nos questionar e nos fazer pensar de uma forma agradável e facilmente aceitável, tinha firmeza e docilidade para nos mostrar suas idéias, tinha coragem e segurança para buscar sua felicidade e, principalmente, tinha um contagiante amor pelas coisas.

Poderia citar aqui milhares de qualidades e coisas boas que Luiz fez em vida, principalmente as do dia a dia, como ficar anos sem falar com uma pessoa por ela ter o hábito de falar mal dos outros pelas costas e depois perdoa-la e ajuda-la a se redimir. Foi Luiz quem praticamente me levou a criar o GEASE, a acreditar que era possível. Foi Luiz o primeiro a dizer que eu deveria presidir o Grupo, imagine: ele foi meu professor, quem me ensinou, quem me arrumou o primeiro emprego e a primeira pessoa a dizer que eu era quem tinha, no momento, as melhores condições de liderar o GEASE, eu pergunto: quantas pessoas neste mundo são capazes de fazer isso?

Tudo isto, aliado às infinitas qualidades e atitudes dele fizeram de Luiz uma das pessoas mais queridas que eu já vi em minha vida, levando até mesmo o médico do Hospital a questionar se aquele homem era uma celebridade, pois raramente vira tamanha comoção ao redor de alguém. A resposta que daria para o médico é: “sim, ele é uma celebridade, pois há poucas pessoas nesse mundo tão notórias quanto essa”.

Mas infelizmente Luiz abandonou hoje, em 27 de fevereiro de 2003, sua vida terrena….

É difícil descrever com justiça uma pessoa que você nunca viu praticar uma ato egoísta, uma pessoa que sempre procurou agir de forma correta, uma pessoa que você sempre admirará, mais difícil ainda é descrever a dor da incerteza de quando a veremos novamente… se ao menos as lágrimas pudessem ser vistas, o vazio pudesse ser sentido, o desolamento pudesse ser explicado, o desespero pudesse ser transcrito, a solidão pudesse ser passada…. aí talvez alguém tivesse a real idéia do que estou passando, mas eu não quero que ninguém sinta a dor, quero apenas que todos sintam por Luiz parte da admiração e carinho que sinto.

Qualquer que seja a religião é unânime a idéia de que há um lugar mais evoluído que a Terra, reservado para as pessoas que fizeram sua passagem promovendo o bem, e é nisso que eu também acredito. Porém, apesar da certeza que Luiz estará em um lugar infinitamente melhor que este, meu egoísmo humano me faz sentir uma imensa falta de sua presença física (sim é egoísmo, pois “eu” estou sentindo, apesar de saber que “ele” estará melhor), e é isto que sinto enquanto minhas lágrimas correm e meu peito dói com o vazio: a sensação de perda, mesmo sabendo que isto é necessário para a evolução de uma pessoa de quem gosto tanto. Mas há uma coisa que me consola e me torna ainda mais forte para seguir minha vida de maneira correta: a oportunidade de reencontra-lo novamente, seja onde for, com o sorriso no rosto do qual tanto sentirei falta durante cada dia de minha vida terrena.

PS: Muitas das coisas que eu disse aqui, também foram ditas ao Luiz em vida, porém não tanto nem tão intensamente quanto eu gostaria. Por favor, diga às pessoas próximas de você, a todo momento, o quanto elas são importantes, pois só no dia em que as perdemos é que vemos o quão pouco fizemos por elas, por mais que parecesse suficiente há um dia atrás.

Luiz, sentimos muito sua falta.

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